Ser tomado por Deus

Existe uma herança através da continuidade invisível de uma experiência com Deus

Há cerca de três semanas levei o pior e último “torrão” de Sol da minha vida, apesar de desde meus sete meses passar os verões na praia e ter sido sempre exaustivamente alertado sobre o uso de filtro solar. Nos dias que se seguiram ao da queimadura fiquei preocupado com a saúde e o aspecto de minha pele, pensando nas consequências que poderiam vir. Foram justamente estes pensamentos que Deus usou para começar a  me ensinar algo que vai além dos fatores de proteção solar.

Ora, sabemos que Jesus é o nosso Sol da justiça, a estrela da manhã e, sendo assim, apenas dEle vem sustento, luz, calor e vida. De Jesus dependemos para tudo, assim como a Terra nada seria sem o Sol:

Mas para vós, os que temeis o meu nome, nascerá o Sol da justiça, e cura trará nas suas asas; e saireis e saltareis como bezerros da estrebaria (Malaquias 4:2).

E ele fará sobressair a tua justiça como a luz, e o teu juízo como o meio-dia (Salmos 37:6).

Eu, Jesus, enviei o meu anjo, para vos testificar estas coisas nas igrejas. Eu sou a raiz e a geração de Davi, a resplandecente estrela da manhã (Apocalipse 22:16).

Sendo assim, pude compreender uma analogia entre o queimar de nossa pele e o queimar de nosso coração. Sobre o último queimar, temos comprovado que existem experiências com o Senhor a partir das quais nossas vidas não são mais as mesmas instantaneamente, e o toque do Espírito Santo modifica nossa estrutura de tal forma que, em determinadas áreas, tornamo-nos irreconhecíveis. No entanto, há muitas situações em que temos uma forte experiência com o sobrenatural de Deus mas, após isso, “nada” acontece. Quando percebemos, minutos depois estamos errando nas mesmas coisas e passando pelas mesmas dificuldades. O que terá acontecido? Teríamos sido ludibriados por nossa alma? Somos tão carnais que não conseguimos reter a unção em nossas vasilhas? Talvez e, muito provavelmente, não. Uma experiência genuína com Deus sempre remete à eternidade e, por isso, dificilmente é perdida. Por ser eterna, mexe não só com o presente, mas com o passado e o futuro. Experiências com Deus podem resolver mágoas de décadas atrás, decepções de hoje e decisões para o amanhã. Sobre o primeiro queimar, também tem se comprovado que marcas provenientes de exposição solar costumam aparecer muitos anos depois, pois requerem que a radiação tenha reagido por um bom tempo com as células de nossa pele. A experiência aconteceu, isto é, a pele foi queimada pelo Sol. O cor ficou avermelhada, ardeu, descamou-se. E depois? Depois parece que nada aconteceu. Assim ocorre com muitas experiências que temos com Deus. O Espírito Santo, que nos toca como um raio e queima o mais profundo do nosso ser, marca nosso espírito com Sua glória e os dois passam a reagir, de modo a manifestar frutos talvez anos depois, no tempo que Deus preparou.

Tudo tem o seu tempo determinado, e há tempo para todo o propósito debaixo do céu (Eclesiastes 3:1).

Conforme escrito em “A Saga da Nação de Pentecostes” (BRAGLIA, 2009), devemos buscar sermos tomados, e não apenas tocados. O firmado na rocha é tomado, e não tocado como o firmado na areia. O tocado busca momentos, enquanto o tomado entende que a sua vida deve ser uma adoração da maneira que mais agrada a Deus, isto é, de acordo com as prescrições repassadas aos hebreus concernentes ao tabernáculo, o primeiro e único lugar específico de adoração sobre a Terra que brotou autenticamente do coração de Deus nas Escrituras. No tabernáculo havia o Santo Lugar, onde ardia fogo em todo o tempo. Mais adiante, no Santo dos Santos, a arca da aliança conservava a presença de Deus sem cessar. Atualmente, além da revelação da menorah, vivemos a realidade de um fluir ininterrupto de águas a partir do altar. O fogo, a arca e as águas nos remetem não apenas à continuidade da adoração, mas também de uma experiência com Deus. Em nossa analogia, o tocado apenas recebe os raios solares (fogo), queima-se e descama; passa um tempo na presença de Deus (arca) e depois age como se não O tivesse dentro de si; ou bebe porções do rio que flui do altar (águas), lava-se, mas depois “transpira” estas águas e se suja, como se o rio da vida lhe fosse apenas um momento puntual.  Este é o entendimento do tocado a respeito de vida com Deus, pois assemelha-se ao padeiro de José e jamais se dá ao trabalho de mergulhar fundo em Deus. As experiências de um tocado duram instantes, intensos ou não, e raramente produzem frutos. Suas queimaduras jamais deixarão marcas, e seu legado não passará de algumas migalhas de pão. O tomado, por outro lado, compreende a continuidade e entende que sua vida com Deus não é feita de momentos isolados, mas desfruta de momentos feitos de vida. A vida do tomado é um grande tempo com Deus, e o céu é seu limite. Ele passa por toques do Espírito Santo também, e conhece as experiências de mudança repentina, mas é paciente e entende que nem todas são assim. O tomado é como o copeiro de José, o qual ao invés de migalhas de pão, deixa como herança uma rica plantação das mais variadas árvores frutíferas.

Conclusão

Não existem fatos puntuais com Deus, não existe subida descontínua da montanha dentro de Seus propósitos. Tudo no Reino é eterno e interligado, servindo para o cumprimento da vontade do Rei. Existem diferentes manifestações de uma experiência com Deus; em suma, aquelas de consequência instantânea e outras cujos frutos precisam ser amadurecidos através da interação contínua entre o Espírito Santo e o nosso espírito. O imediatismo, resultado de imaturidade, tem feito com que desistamos de algumas das porções mais nobres que Deus tem para nós, pois muitas delas vem através de esperarmos pacientemente a reação do Espírito Santo em nós decorrente de uma experiência com Deus. Portanto, não precisamos nos frustrar caso tenhamos vivido algo muito intenso em Sua presença e depois, aparentemente, “nada” aconteceu. Caso haja frustração, ela deve ocorrer caso olhemos para atrás e, tendo analisado o quanto deixamos que o Senhor nos atingisse, percebermos que tudo não passou de um toque. Se permitimos que o Sol da justiça tenha apenas nos tocado, terá sido apenas mais um mover, mais um momento, como o fogo que míngua o feno; tampouco uma consequência instantânea teremos. Será como o queimado do Sol que, após a descamação, até o fim de sua vida não verá marcas solares em sua pele. No entanto, se o Espírito Santo nos tomar, um queimar profundo nos atingirá continuamente, assim como o fogo da menorah. Embora possa levar anos até que vejamos marcas, uma vez que apareçam jamais serão apagadas, tal qual ocorre entre o Sol natural e a pele. Portanto, mesmo que não vejamos, caso decidamos ser tomados por Deus algo sempre, no mínimo, será gerado em nós e evidenciado no tempo da maturidade. Frutos gerados desta maneira são grande herança do Senhor para nós, cujas sementes e suas respectivas árvores serão nosso legado para a próxima geração.

Gabriel Ferrari – Professor, levita e diácono da Nação dos Montes

Igreja de Florianópolis – Nação dos Montes